Cenas de um casamento Carlos Araújo e Dilma, dos tempos de prisão à separação amigável
Ex-marido de Dilma Rousseff, o gaúcho Carlos Araújo lembra da paixão instantânea entre os dois, conta que trocaram bilhetinhos na prisão e diz que o fim do casamento de 25 anos foi tranquilo-sem brigas, confusão ou traumasEle se orgulha em dizer que os dois preservaram uma relação de cumplicidade rara entre divorciados-embora não vivam juntos desde 1995, nunca deixaram de se falar. "Temos temos assuntos a tratar, a vida,nossa filha, nosso neto", diz. Durante a campanha a presidência, era na casa dele que Dilma se ospedava quando ia a Porto Alegre montava a barraca lá junto com a ex-sogra e sua irmã para evitar qualquer tipo de insinuação mal-intencionada de adversários. Só não se veem mais porque Araújo evita ir a Brasília. 'A cidade é quente e seca demais, ruim para quem tem problema de saúde como eu. Sempre passo mal", explica. Ele sofre de enfisema pulmonar, herança de décadas como fumante.
Três vezes deputado estadual pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), legenda do amigo Leonel Brizola, Carlos Araújo pede que a entrevista não demore porque sente falta de ar se conversa muito. Charme, ao que parece, pois ele desandou a metralhar uma frase atrás da outra. Sem contar que acabara de passar a tarde em reuniões políticas em sua casa - uma das atividades que mais lhe dão prazer. Começa a entrevista lamentando não ter conseguido participar da campanha de Dilma como gostaria. "Eu estava muito doente, cheguei a ser internado. Mas nunca duvidei de que ela venceria, mesmo com o segundo turno. Foi até uma campanha tranquila", observa. "Vi a confirmação da vitória dela durante o dia da votação, acompanhando pelo rádio e pela TV, em casa, porque não passava bem."
Os dois se falaram na mesma noite, ele queria ser um do primeiros a parabenizá-la. Foi, ao que parece, um papo em que se confundiram imagens e lembranças de uma vida de luta pelo mesmo ideário, muito mais do que entre ex-casados. "Tivemos uma vida de luta juntos, amizade e respeito um pelo outro." Seu tom de voz tranquilo não muda quando perguntado sobre sobre o fim do casamento. Ele revela que os dois decidiram se separar em comum acordo, "sem brigas, confusão ou traumas", porque chegaram à conclusão de que depois de 25 anos havia se esgotado a relação afetiva. Decidiu-se que cada um seguiria seu caminho e ela mudou de casa.
Amor à primeira vista
Os caminhos do casal se embrulharam em 1969.
Filho de um empenhado advogado comunista, Araújo se envolveu com política na faculdade e passou a militar no movimento operário. Com a crise que se seguiu ao Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968 - que fechou o Gongresso, cassou os direitos de todos os cidadãos e intituiu a sensura - ,ele decidiu pegar em armas. Fez contato com o comando da Libertção Nacional (Colina), de Belo Horizonte, e foi convidado a participar de uma reunião no Rio de Janeiro. Ao chegar, seu olhares foram desviados para uma jovem de 21 anos que usava o codinome Wanda e vivia na clandestinidade. Não sabia que era casada havia dois anos e se encantou por ela. Já na segunda reunião, pouco depois, eles foram morar juntos. "o que chamou minha atenção foi a beleza. Dilma era uma mulher muito bonita e, ao mesmo tempo, segura, de si, confiante. Aquilo me fascinou."
De uma cinceridade desconcertante, Dilma procurou o marido, o jornalista mineiro Claúdio Galeno, e comunicou sua decisão de viver com Araújo, cujo codinome era Max. Mesmo cassados pela repressão, viveram juntos boa parte daquele ano. Em janeiro de 1970, porém, Dilma foi presa em São Paulo, torturada na prisão da Operação Bandeirantes, (Oban) e levada para o Presídio Tiradentes, no Carandiru. Araújo "caiu" - foi preso em agosto.
Os dois, então, faziam parte da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), de Carlos Lamarca, que havia se fundido com o Colina. Por um tempo, o contato entre os dois prisioneiros foram as mães, que os visitavam alternadamente, num leva e traz delicado de notícias e bilhetes. "Todo mundo sabe, nos presídios sempre se dá um jeito de passar bilhetinhos." Eram mensagens que davam força um para o outro - ou mesmo discutiam política. "Claro que havia as cartas românticas também, a troca de carinho, de amor que nos unia, os planos para depois que ficássemos livres."
Dilma ficou presa dois anos e dez meses em São Paulo, enquanto Araújo passou temporadas no Rio e em São Paulo e foi levado, em agosto de 1973, para cumprir pena em porto alegre - o presídio ficava a apenas 800 metros da casa de seus pais. Dilma ficou meses na casa dos sogros até conseguir o direito de visitar o namorado, já que não eram oficialmente casados - condição exigida pela lei. Livre em 1974, Araújo continuou na capital gaúcha, morando com Dilma. Aos 35 anos, tratou de reconstruir a vida e assumiu o escritório do pai, que tinha acabado de falecer.
Carlos Araújo é só elogios para Dilma, mesmo quando fala de seu estilo durão, desafiador. E garante que o jeito que governa não tem nada de forçado, tudo é "muito natural". Mas lamenta que, na berlinda do cargo mais importante do país, só a faceta durona ganhe destaque. "Dilma tem uma personalidade forte, é exigente em tudo que faz, gosta de botar ordem nas coisas, esses são traços marcantes nela. Era assim também em casa. Mas sobressaía mais a pessoa justa que ela é, afetuosa, carinhosa, agradável de conviver." E finaliza:
"Tudo que ela passou pela vida serviu de aprendizado, como se aquilo fosse necessário para Dilma transformar o país sem grandes conflitos. Os brasileiros mostram nas pesquisas que sentem nela seriedade, empenho, dedicação, a vontade de fazer da melhor forma possível. E ela pode e vai fazer muito mais. Tenho certeza disso."
"O que me encantou nela foi a beleza, era muito bonita e, ao mesmo tempo segura de si, confiante"
"Dilma gostava de botar ordem nas coisas em casa também, mas ela tem seu lado carinhoso"
Fonte: Revista Lola Magazine Edição 22 julho 2012
twitter.com/Briefingdocandi